Deus Não Julga (Padinha)

Sempre que vou ao Rio sinto que vejo a pobreza mais de perto, principalmente na entrada da Cidade Maravilhosa, olhando para o lado direito de quem entra, no sentido Juiz de Fora-Rio. As casas construídas com pedaços de caixotes à beira do mangue, os barracos de concreto sem reboque, as ruas sujas, apertadas e sem estrutura, os urubus sobrevoando o lixão, os pedintes, os que dão esmolas, os que olham e passam e os que passam, olham e sentem o clima pesado da miséria, mas não vivem nela (me enquadro nessa categoria).

Descobri há uns meses atrás que a miséria está mais perto que pensamos e que fingimos não ver para ficar mais fácil lidar com nossa consciência. Aqui mesmo, perto de casa, subindo até o final da minha rua, chego ao bairro Dom Bosco. Aqui do lado, bem pertinho, lá no finalzinho, bem lá em cima, no morro, mas não é tão longe assim. Estive em uma sede da ABAN e vi casas de barro batido em estruturas de bambu, crianças desnutridas, barracos pendurados nos barrancos e o perigo eminente dos desabamentos.

Não sou contra dar esmolas, mas creio que não erradica o problema, apenas ameniza a culpa do descaso que mora em nós. O Brasil não é um país pobre, mas um país extremamente injusto e desigual, com muitos pobres. O que me causa tristeza é saber que sou brasileiro e cometo o mesmo erro. Não posso agora tentar levantar a bandeira mascarada da inocência. Ando afastado do terceiro setor por pura preguiça e comodidade.

Igual a mim estão centenas de políticos, carregando nas costas o fardo agravante do poder. Podemos nós, trabalhadores brasileiros, tentar fazer a nossa parte por menor que seja. Cabe aos que governam que ditam as regras do País resolver o problema ou pelo menos tentar. Contudo, a luta neste momento não é contra as políticas compensatórias que são apoiadas em ultima instancia pelos organismos multilaterais, tampouco é entrar no frenético debate das distorções provocado pelas estatísticas e números de órgãos governamentais. A questão central é: como mudar de forma concreta e a realidade de milhões de brasileiros.

Não creio que o atual modelo neoliberal, que insiste em sobreviver na política ortodoxa e concentradora de renda, seja a solução. Vencer a pobreza e a miséria se faz com desenvolvimento econômico, com valorização do trabalho, com distribuição de renda, com geração de emprego, com políticas públicas de qualidade (educação, saúde, previdência) e extensiva a todos. Derrotar a pobreza e a indigência é lutar por um novo modelo de desenvolvimento em nosso país. A pobreza é o maior mal que envolve uma nação e isto é decorrência direta da situação econômica vigente, ou acumulada ao longo da história de estagnação, de desemprego, de falta de investimentos na economia e, sobretudo, de descontrole das autoridades em fazer um país crescer de maneira harmoniosa e equilibrada.

A angústia da pobreza aparece nos momentos de mendicância; com a formação incessante de favelas, onde diuturnamente se vê filhos chorando por comida e não existe nada para comer. Pessoas querendo trabalhar e não há emprego e nem tão pouco onde se ocupar para conseguir sanar a fome de curto prazo. É essa penúria e muito mais, que circunda a vida de quem não tem trabalho, não tem criatividade para procurar um meio de sobrevivência digno.

Em síntese, dizem que o Brasil é um País rico, com muito ouro, diamante, recursos minerais e vegetais que em outras nações não existem. Mas, como se pode ser uma nação rica, com seus filhos paupérrimos? A renda nacional, que por ventura tenha crescido, serviu unicamente para incrementar as contas bancárias de banqueiros domésticos e externos e implementar as atividades de multinacionais que só fazem explorar os consumidores do país.

O Brasil é um país pobre, não vale apenas querer aparecer no cenário internacional como uma potência mundial, se olhamos para o lado e notamos que a coisa não caminha bem, nem tão pouco há perspectiva de um desenvolvimento que leve a nação a ter, um bem-estar condigno com o esforço de seus filhos que tanto lutam para crescerem bem. Não existe glória em sentir pena da miséria se não arregaçarmos as mangas e darmos não apenas a esmola, mas tentarmos com nossos meios, resgatar o amor próprio e a dignidade de quem pede. Muitas vezes ouvir e dar atenção surte mais efeito que dar alguns trocados para quem já perdeu as esperanças e o amor pela vida!

Precisamos de uma reforma interior, parar de esperar soluções políticas e fazermos a nossa parte! Vamos esquecer nossos governantes. Deus não julga, não condena e não pune. Deus dá sempre a misericórdia da oportunidade! Que cada um pegue a sua e faça algo de útil.

Antonio de Padua (Padinha) - Fotógrafo, diretor do site O Click e colunista nas horas vagas!