Por Christina Ferraz Musse

 

Esta semana, fiquei sabendo, pela imprensa, que o Brasil é o quarto país em número de academias de ginástica no mundo, sendo considerado hoje um pólo extremamente atraente de investimentos nesta área, chamando a atenção inclusive dos fabricantes internacionais de aparelhos de ginástica. Achei bem interessante que tanta gente se interessasse pela "malhação", aliás, prática que eu considero muito saudável, desde que, sem os exageros que a gente acaba observando por aí.

Dia desses, uma amiga comentava comigo sobre suas aulas de "spinning", uma modalidade que virou mania nas academias, consumindo dezenas de calorias em menos de uma hora de pedaladas. Até aí, tudo bem. O problema era que, para conseguir fazer a aula, o interessado tinha que chegar cedo e se inscrever numa lista de espera. Também não vejo nada demais neste procedimento, que me parece até mesmo deveras democrático (apesar de filas provocarem em algumas pessoas, como eu, uma leve sensação de estresse). O detalhe que me intrigou foi outro: segundo minha amiga, duas inscritas começaram a disputar a mesma bicicleta e de forma pouco delicada do tipo: "vamos resolver isto aqui, agora, ou na porrada?" Pelo que fiquei sabendo, pelo relato da amiga, tudo acabou em boa paz, mas imaginem o risco, a tensão, o desconforto...

Conversando com outra colega, fiquei também meio impressionada. Ela estava empenhada em várias atividades ao mesmo tempo: nadava, fazia musculação, ginástica, além de trabalhar, cuidar dos filhos e da casa. Até me convidou para entrar na maratona dos exercícios, mas eu agradeci, já que a minha resistência não vai tão longe. Eu fiquei até com um pouco de inveja da capacidade dela conseguir ajustar o tempo para tantas tarefas diferentes e desempenhá-las todas bem. Mas ela acabou me confessando, rindo, que o marido andava reclamando, que estava sendo colocado de lado. Foi aí que eu me flagrei, pensando: "Será que vale a pena? Será que ela não tem medo do marido se encher e ir procurar outra?" Reconheço que pensei mais com o lado Yang da mente, fui meio machista sim, mas, volto a perguntar: "Será que vale a pena?"

Se você não é um desportista profissional, se não fica o dia inteiro à toa, por que "malhar" de forma tão obsessiva, esquecendo-se de tanta outras coisas importantes no equilíbrio do dia-a-dia, na harmonia da vida? Sempre fui adepta de exercícios, sempre os pratiquei, mas não posso aceitar que o exercício se torne uma mania, ou uma tortura, ou um vício. Nestes casos, acho que praticá-los faz mal e deixa de ser prazeroso e realmente saudável. Você acaba se transformando num escravo e, neste tipo de relação, é a sua cabeça que acaba perdendo.

Esculpir o corpo virou uma coisa obsessiva. Revistas especializadas gastam páginas e mais páginas descrevendo a rotina de pessoas que acordam de madrugada para fazer "jogging", almoçam correndo para não deixar de frequentar a academia e chegam em casa tarde, porque tiveram que completar a dura rotina de exercícios. Para um atleta, bem assessorado, tudo bem: é a vida dele, a profissão dele. Mas quem não é atleta e se deixa levar pela ditadura da boa forma? Será que não é uma maneira de fugir dos defeitos, das imperfeições, das lacunas, que nos acompanham por toda a vida e, que de uma forma ou outra, acabamos tendo que encarar? Afinal, o que as revistas vendem não é um parâmetro viável de saúde, mas um modelo praticamente inatingível de beleza, que nos transforma a quase todos em angustiados escravos dos espelhos e das balanças.

Acredito que o esporte deve ser uma prática alegre, democrática e prazerosa. Acho que um corpo bonito, saudável é das coisas mais lindas de se ver e sentir. Mas o esporte e a "malhação" não podem ser transformados numa armadilha, numa prisão, como é a dependência, o vício. Acho que todo mundo deveria fazer uma conta: calcular quantas horas por dia dedica ao corpo, à cabeça, ao outro. Talvez o resultado traga algumas surpresas reveladoras. Possivelmente, você acabe chegando à conclusão de que está pedalando demais e namorando de menos, correndo demais e lendo de menos, competindo demais e brincando de menos, o que não é nada grave se você, pelo menos, souber a hora de parar, dar uma guinada e recomeçar...

Christina Ferraz Musse